Erlaine Rodrigues Silva
O Documento - 25/05/2012
Em mais uma tentativa de fazer com que a Constituição
Federal seja cumprida e que o concurso público seja a forma de acesso aos
cargos públicos, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou recentemente o
procedimento de converter a Súmula 685 em súmula vinculante.
A Súmula 685 dispõe que "É inconstitucional toda
modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia
aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não
integra a carreira na qual anteriormente investido".
Antes da Constituição, promulgada em 1988, era possível ao
servidor público passar de um cargo a outro com ocupação diversa daquela para
qual tinha feito concurso. Mas, o tempo mostrou que essa forma de acesso
acabava criando um campo fértil para práticas de nomeação calcadas no
clientelismo e no apadrinhamento, o que acabava gerando maneiras de burlar as
regras que previam o concurso público. Os apadrinhados faziam concurso para um
cargo com menor complexidade e, partir daí, usavam a transposição para ter
acesso aos cargos mais complexos e melhor remunerados.
Para coibir essa prática e garantir o direito de igualdade
no acesso às carreiras públicas, bem como para garantir a seleção dos melhores
candidatos, que refletirá numa melhor prestação dos serviços públicos, o
Constituinte proibiu a transposição de cargos.
No entanto, a previsão constitucional não foi suficiente
para acabar com a prática do apadrinhamento. De norte a sul, várias Leis foram
editadas para burlar a exigência prevista no inciso II do artigo 37 da
Constituição Federal.
Ora criava-se uma nova carreira mais complexa, melhor
remunerada e com atribuições diversas daquela que existia e, sob o argumento de
que se tratava apenas de reformulação, fazia-se a transposição dos servidores
para a nova carreira sem passarem por concurso público; ora aprovava-se
primeiro uma Lei equiparando as atribuições dos cargos diversos que se desejava
unificar para, depois, também por Lei, promover a união das carreiras
envolvidas. A edição de tais Leis são sempre calcadas em modernas “teorias” da
administração pública, supostamente defensoras da eficiência administrativa.
Em Mato Grosso, essa prática também pôde ser observada. Um
exemplo é a edição da Lei 98/2001, que fez a transposição dos servidores que
estavam investidos nos cargos de nível médio, de Agente de Fiscalização de
Tributos Estaduais (AFATE) e de Agente Arrecadador de Tributos Estaduais (AATE)
para o cargo de Agente de Tributos Estaduais (ATE) que não integrava as
carreiras dos servidores transpostos e que exige nível superior como requisito
de ingresso. A transposição foi feita sem que esses servidores fizessem
concurso público para o novo cargo.
Diante de tantos atos arbitrários, originaram-se várias
Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI’s) e o STF sumulou o seu
posicionamento por meio da Súmula 685, buscando inibir a aprovação de Leis que
são contrárias ao dispositivo constitucional.
Todavia, parece que a edição da Súmula não foi suficiente.
Os governos, contando com o tempo a seu favor -- pois uma ADI pode demorar anos
para ser julgada --, prosseguiram com as práticas antigas de um Estado
patrimonialista e clientelista, a ponto de o Supremo iniciar um procedimento
para edição de súmula vinculante e, quiçá, tornar mais célere os desfazimentos
de Leis e atos arbitrários e antidemocráticos que continuam persistindo.